Borboletas

De começo é de se estranhar os passos mais lentos, cautelosos, sutis. Pra quem estava acostumada a correr, a chegar primeiro, a ver o antes... de fato é estranho a mudança de sintonia. É como sair de uma banda punk e ir tocar bossa nova, aquele samba meio jazz. É como acordar de um pesadelo, olhar para o lado e ver que alguém deixou flores para você em cima da sua estante. É mudança brusca, de amargo para o doce. E confesso, passei anos assim, correndo com meus passos largos, pisando firmemente para não tropeçar, não cair. Passei tempos vivendo tudo intensamente, seguindo a lei de "se o tempo é curto, intensamente viverei". Mas já faz alguns anos que estou estável num lugar, sem previsão de partida, coisa inédita na minha vida. Vivendo sem prazo de validade, juro que esperei muito por isso. Porém nem tudo dura o tempo que gostaríamos que durasse, essa lei é universal. Mas esses dias me dei conta que de alguns meses para cá a minha sintonia mudou. Não lembro exatamente o motivo, mas lembro exatamente o dia: estava andando numa rua, apressada, segurando firme a minha bolsa para conseguir manter o equilíbrio da caminhada, e então parei e pensei "Porque estou andando tão rápido se não estou atrasada para nenhum compromisso?". Foi aí que eu vi que eu ainda vivia tudo como antigamente, ainda vivia tudo com a respiração tensa com aquele receio de que não iria aproveitar da maneira certa aquilo que me acontecia. No mesmo momento comecei a andar mais devagar, com passos lentos e delicados. Desafrouxei os dedos da alça da bolsa, dedos que as vezes chegavam a doer a mão do tanto que eu os apertava para manter a bolsa em sintonia com os meus passos rápidos. Os primeiros dez metros foram estranhos, as vezes eu ainda queria apressar o passo, mas pra que? As vezes a gente, teimosamente, procura dar passos maiores que as nossas pernas, e o resultado não é desconhecido para ninguém, nunca dá certo, é frustração na certa! E não tem nada pior do que correr ansioso, com mil expectativas e voltar se rastejando para casa, com as pernas bambas de quase não conseguir andar, pois a queda foi quase que do nono andar. Depois desse dia procurei adotar essa leveza na minha vida, em todos os aspectos. Chega de coisas eufóricas, chega de rodas punk dentro de mim, agora eu quero a bossa, agora eu quero os momentos mais simples e viver estes da melhor maneira que existe, intensamente! E engana-se você que pensa que cai em contradição neste momento, não caí não. A intensidade que falo agora não é aquela do começo do texto. A do começo do texto na verdade não aproveitava nada, ficava tão ansiosa que os detalhes mais importantes passavam batidos. Essa nova intensidade é mais leve, é menos desesperadora, menos medrosa, é intensidade na medida certa. Aquela que é cautelosa no esperar dos dias passarem, para no final de semana se deliciar com o encontro esperado. É aquela intensidade que te permite respirar com calma, mas que te também te deixa sem ar nos momentos certos. É a medida certa de aproveitar o que a vida oferece, sem caos e sem confusões de borboletas na barriga... e sim todas elas organizadas.

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